Pus-me a cantar minha pena
Com uma palavra tão doce,
De maneira tão serena,
Que até Deus pensou que fosse
Felicidade - e não pena.
Anjos de lira douradade
Debruçaram-se da altura.
Não houve, no chão, criaturade
Que eu não fosse invejada,
Pela minha voz tão pura.`
Acordei a quem dormia,
Fiz suspirarem defuntos.
Um arco-íris de alegria
Da minha boca se erguia
Pondo o sonho e a vida juntos.
O mistério do meu canto,
Deus não soube, tu não viste.
Prodígio imenso do pranto:
- todos perdidos de encanto,
só eu morrendo de triste!
Por assim tão docemente
Meu mal transformar em verso,
Oxalá Deus não o ausente,
Para trazer o Universo
De pólo a pólo contente!
Cecília Meireles
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